quarta-feira, 4 de julho de 2007

A METÁFORA DE BELARMINO

Crónica de Baptista Bastos, editada no Jornal de Notícias
Título á boa maneira dos minhotos chamarem os bois pelos nomes:

O CAGAROLA

"Se não aguentas seis assaltos, o melhor é desistires logo à primeira." Disse-me Belarmino Fragoso, com quem pratiquei boxe, no Desportivo da Mouraria. Belarmino era um campeão sem medo; porém, um homem malicioso e sábio. Eu, um rapaz esgalgado e um pouco mais intempestivo do que hoje sou. A frase ocorreu-me, como metáfora, ao ler que José Sócrates, no acto inaugural da Presidência Europeia, entrou, sorrateiro, pelo parque de estacionamento da Casa da Música, a fim de escapar a uma manifestação de protesto.Digo-o de forma amistosa: Sócrates não resiste a dois assaltos. Posa de leão indomesticável, mantém um semblante grave, mas escapule-se, furtivo, à mais leve suspeita de distúrbio. A pesarosa cena, no Porto, fornece-nos o retrato de um homem que recusa enfrentar os problemas por si próprio criados e que transforma o abstracto numa vitória sobre o concreto.
(...)
No Porto, ao desembaraçar-se da maçada de ter de ouvir protestatários no desemprego, José Sócrates ilustrou a metáfora do campeão. Deixou-nos a inquietante suspeição de que ou é tímido, ou medroso, tímido ou pedante. E perdeu o momento de demonstrar, a tão egrégios convidados, que o diálogo pode ser o antídoto do ruído.