quinta-feira, 6 de setembro de 2007

A rosa murcha de Sócrates e o espinho cravado de Barra

Por cá, no concelho profundo há novidades ressequidas. Vasco de Carvalho anunciou que estava disponível para ser candidato à Câmara Municipal. Fê-lo pela enésima vez, e, pela enésima vez, os "cães-de-fila" usaram o velho advogado para sujar papel.
Desde que tenho memória, Vasco sempre foi cadidato a candidato, mas invariavelmente acaba a comentar as vitórias de Fernando Reis aos microfones da sua rádio Cávado.
Do mal o menos, fica-lhe bem a coerência: auto-anuncia-se, põem-se em bicos de pés, mas como ninguém o leva a sério, nem mesmo os "cães-de-fila" que sujam papel nos jornais, ele lá volta ao estatuto de comentador residente.
E enquanto Vasco anima o circo do Verão, no Partido Socialista os espinhos da rosa viraam-se contra Horácio Barra.
Dizem que um seu adversário interno angariou 500 novos militantes. O Barcelos Popular apressou-se a chamar-lhe "chapelada". Eu diria barrete. Grande barrete. Chapelada é descarregar votos sem que haja eleitores reais. Nunca angariar militantes. Barrete é o que o Barcelos Popular enfiou, ainda, quando na ânsia e ganância de defender o Compadre Barra, escreveu que estes votos nunca contarão porque o Secretariado vai fazer tudo para encravar o processo de validação! Assim mesmo, à descarada. À "não isento", mas "independente".
De tudo isto, o concelho profundo retira uma lição. Valente Vasconcelos. Fizeste o Barcelos Popular dizer que para o actual Secretariado Socialista, até vale fazer batota na secretaria para "eliminar" militantes contestatários. Ou será que o jornalista inventou? A ser assim, vamos ver se alguém da direcção do PS vem desmentir a notícia. Esperemos sentados!

E com as coisas assim, no ConcelhoProfundo, leiam com atenção o seguinte artigo de Baptista-Bastos. Vale a pena.

A ROSA MURCHA DE SÓCRATES

Baptista-Bastos
escritor e jornalista
b.bastos@netcabo.pt

No emocionado êxtase de si próprio, José Sócrates anda pelo País a distribuir computadores. Faz discursos repletos de adjectivos e de nenhumas reticências. Como ninguém dá nada de graça, os recebedores das máquinas têm de as pagar, mais tarde ou mais cedo, acaso com leves descontos. Tudo em nome da ciência, da tecnologia e do conhecimento. E ponha lá, também, da "esquerda moderna", instrutiva expressão inventada nos melancólicos vagares de José Sócrates. Os portugueses estão cada vez mais aflitos, andam cheios de Prozac, enchem os consultórios de psicólogos e de psiquiatras, e o querido primeiro-ministro entrega-lhes computadores, na presunção de que vai erguer o moral da pátria.

Portugal existe numa litografia graciosa e colorida, segundo no-lo é apresentado pelo Governo. Mas os números do desespero são assustadores. Admito que as evidências da realidade sejam extremamente maçadoras para a desenvolta modernidade do Executivo: meio milhão de desempregados; dois milhões de compatriotas em risco de pobreza; três milhões de famílias endividadas em cerca de 1,2 vezes o seu rendimento anual; 48 mil professores sem colocação; milhares de enfermeiros em estado de susto; e as dez maiores fortunas do País cresceram quase 14%.

Possuo enorme rol de malformações sociais, criadas, aumentadas ou não resolvidas por este Governo que somente serve para nos dar desgostos, enquanto acusa os objectantes de intrigas rasteiras e manobras sórdidas. A verdade é que começamos a assistir a pequeninas insurreições de militantes do PS, que apontam Sócrates à execração socialista e o acusam de ter murchado a rosa. Ainda há dias, Alfredo Barroso deu alguma luminosidade ao triste Sol do Saraiva, aproveitando o rodapé em que foi paginado o seu artigo para reduzir a subnitrato este PS, o Governo e adjacências. É um texto exemplar, pelo que nomeia de danos irreversíveis provocados pela vigência destes "socialistas modernos".

Porém, José Sócrates não só dissolveu as expectativas nele depositadas. Avariou, irremediavelmente, a grandeza de intenções contida na ideia de socialismo. Guterres causara amolgadelas graves no corpo cambaleante do infeliz partido, mas nada que se compare às cacetadas de Sócrates. Daqui para o futuro quem vai acreditar nos socialistas, no socialismo, no PS?, cuja história carrega um peso insuportável de derivas, desvios e traições.

José Sócrates pode ser um guloso de tecnologia, um amante desvairado de cibernética, um "animal feroz", como se definiu numa preguiçosa e insensata entrevista ao Expresso. O que José Sócrates não é, sabemo-lo todos - e todos os dias: nem socialista, nem grande político nem grande primeiro-ministro.|